sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Um "Jardim Estranho" em frente ao Palácio Anchieta



(Por Maura Fraga)

Sexta-feira à noite, ao passar pelo Palácio Anchieta, no sentido Centro- Praia do Canto, me dei conta do "Jardim Estranho" que brotou no Dia da Consciência Negra", em frente à antiga sede do Governo.

As 500 cruzes de alvenaria, plantadas no gramado verdinho, bem cuidado, representam 500 jovens, dos quais 93% negros, assassinados no Espírito Santo no primeiro semestre deste ano de 2009.

Colocadas por manifestantes do Fórum Estadual da Juventude Negra do Espírito Santo que percorreram em passeata as ruas de Vitória, servem de alerta para a situação do jovem na periferia, onde as políticas públicas não chegam.

Neste sábado à noite passei de novo em frente ao Palácio- reaberto na sexta-feira como Museu, após a custosa reforma- e vi que o " Jardim Estranho" continua lá.

A cena é comovente e me lembrou, desde o primeiro momento, a canção "Strange Fruit" (Fruto Estranho) interpretada por Billie Holiday, resgate da execução de negros por enforcamento, nos Estados Unidos.

Billie ganhou a canção, em 1939, do escritor Lewis Allan ( um certo professor Abel Meeropol), quando cantava no clube Café Society, de Nova York.

Perturbada com a letra, teria dito ao trompetista Frankie Newton: “Um sujeito me trouxe uma maldita canção e acho que vou cantá-la”.

Uma noite, com apenas um spot no rosto, cumpriu o prometido. Interpretou a canção inspirada nos corpos dos negros, pendurados, enforcados nas árvores, uma cena comum do sul dos Estados Unidos.

O primeiro disco veio logo depois através de uma pequena gravadora. A música estourou no país. .

A letra, traduzida, é um rito de dor. Certamente os manifestantes que fixaram as cruzes em frente ao Palácio Anchieta, construíram o "Jardim Estranho" sem conhecer essa história.

Em reconhecimento ao seu desejo de superação do exercício do ódio racial, abro este post com Billie interpretando "Strange Fruit" que a revista Time considerou a maior de todas as canções americanas:

" Árvores sulistas dão um fruto estranho/Sangue nas folhas e sangue na raiz/ Corpo negro balançando na brisa do Sul/Fruto estranho pendendo nos álamos/Cena pastoral do Sul maneirista/Os olhos esbugalhados e a boca torcida/Perfume de magnólia, doce e fresco/Então, o súbito cheiro de carne queimada!/Eis o fruto para os corvos bicarem/Para a chuva castigar, para o vento sugar,para o sol decompor, para as árvores deixarem cair/Eis uma estranha e amarga colheita". (Strange Fruit/ tradução)

C/ Outros

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